domingo, 16 de fevereiro de 2014

DEU PANGO-SURUPANGO



DEU PANGO-SURUPANGO

Uma velha tinha nove filhas,
Todas a fazer biscoito;
Deu pango-surupango numa delas
E das nove ficaram, oito.

Essas oito – meu bem! – que ficaram
Foram comprar confete;
Deu pango-surupango numa delas
E das oito ficaram sete.

Essas sete   - meu bem! – que ficaram
Foram jogar xadrez;
Deu pango-surupango numa delas
E das sete ficaram seis.

Essas seis – meu bem! – que ficaram
Foram comprar um brinco;
Deu pango-surupango numa delas
E das seis ficaram cinco.

Essas cinco – meu bem! – que ficaram
Foram um dia ao teatro;
Deu pango- surupango numa delas
E das cinco ficaram quatro.

Essas quatro -  meu bem! – que ficaram
Foram aprender francês;
Deu pango-surupango numa delas
E das quatro ficaram três.

Essas três – meu bem – que ficaram
Foram passear nas ruas;
Deu pango-surupango numa delas
E das três ficaram duas.

Essas duas  - meu bem – que ficaram
Foram brincar na espuma;
Deu pango-surupango numa delas
E das duas ficou só uma.

Essa uma – meu bem! – que ficou
Foi para a correção
Deu pango-surupango na coitada
E acabou-se a geração!


      Antonio de Pádua Morse –“ Quem contou foi o Mindinho”

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

DONA FELICIDADE

DONA FELICIDADE

Dona Felicidade é uma velhinha,
                Tão velha como o destino,
Que mora numa velha capelinha
                De uma só porta e só de um sino!

Dizem que é feiticeira:
Que toda sexta-feira
Monta à vassoura e vai para o sabbat...
E aparece aos mancebos nas estradas,
Como as boemias Willis encantadas,
Prometendo Tesouros que não dá.

Entretanto, eu me lembro, quando criança,
Minha avó não cansava de contar:
“Dona Felicidade é a Santa esperança,
Cabelos de ouro e olhos cor do mar...”

Mas pelo tempo que ela foi gerada,
_Antes do paraíso de Moisés,
Hoje, deve estar toda encarquilhada,
Cabelos brancos, arrastando os pés!

Dona Felicidade é uma velhinha
                Tão velha como o destino
Que mora numa velha capelinha
                De uma só porta e só de um sino!

Ela é boa senhora. Se hoje em dia
Não abre a sua porta a qualquer peregrino,
                Como outrora fazia,
Conforme a lenda do melhor destino
É que está cega, surda e já não anda
De tão velhinha que ela está.
Apesar disto, a Bíblia sempre manda:
“Batei... batei que ela vos abrirá.”


(Theoderick de Almeida / Ouro, incenso e Myrrha, 1931)

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Lira do amor romântico Ou a eterna repetição

Atirei um limão n’água
e fiquei vendo na margem.
Os peixinhos responderam:
Quem tem amor tem coragem.

Atirei um limão n’água
e caiu enviesado.
Ouvi um peixe dizer:
Melhor é o beijo roubado.

Atirei um limão n’água,
como faço todo ano.
Senti que os peixes diziam:
Todo amor vive de engano.

Atirei um limão n’água,
como um vidro de perfume.
Em coro os peixes disseram:
Joga fora teu ciúme.

Atirei um limão n’água
mas perdi a direção.
Os peixes, rindo, notaram:
Quanto dói uma paixão!

Atirei um limão n’água,
ele afundou um barquinho.
Não se espantaram os peixes:
faltava-me o teu carinho.

Atirei um limão n’água,
o rio logo amargou.
Os peixinhos repetiram:
É dor de quem muito amou.

Atirei um limão n’água,
o rio ficou vermelho
e cada peixinho viu
meu coração num espelho.

Atirei um limão n’água
mas depois me arrependi.
Cada peixinho assustado
me lembra o que já sofri.

Atirei um limão n’água,
antes não tivesse feito.
Os peixinhos me acusaram
de amar com falta de jeito.

Atirei um limão n’água,
fez-se logo um burburinho.
Nenhum peixe me avisou
da pedra no meu caminho.

Atirei um limão n’água,
de tão baixo ele boiou.
Comenta o peixe mais velho:
Infeliz quem não amou.

Atirei um limão n’água,
antes atirasse a vida.
Iria viver com os peixes
a minh’alma dolorida.

Atirei um limão n’água,
pedindo à água que o arraste.
Até os peixes choraram
porque tu me abandonaste.

Atirei um limão n’água.
Foi tamanho o rebuliço
que os peixinhos protestaram:
Se é amor, deixa disso.

Atirei um limão n’água,
não fez o menor ruído.
Se os peixes nada disseram,
tu me terás esquecido?

Atirei um limão n’água,
caiu certeiro: zás-trás.
Bem me avisou um peixinho:
Fui passado pra trás.

Atirei um limão n’água,
de clara ficou escura.
Até os peixes já sabem:
você não ama: tortura.

Atirei um limão n’água
e caí n’água também,
pois os peixes me avisaram,
que lá estava meu bem.



Atirei um limão n’água,
foi levado na corrente.
Senti que os peixes diziam:
Hás de amar eternamente.
Carlos Drummond de Andrade / Amar se aprende amando/

sábado, 1 de fevereiro de 2014

A História do Sr. Shi que Comia Leões



Início de ano, uma postagem mais leve:

Um pequeno conto, escrito em Chinês Clássico, em que todos os caracteres são pronunciados "Shi", mudando apenas o tom (se você já estudou um pouco de chinês, já sabe o que é isso; caso contrário, continue lendo aqui dentro dos parênteses: cada ideograma é uma sílaba, cada sílaba é composta de um som inicial, um som final e um TOM = a entonação própria da sílaba. Se pronunciarmos o tom de maneira errada, não seremos compreendidos).

《施氏食狮史》 
石室诗士施氏,嗜狮,誓食十狮。施氏时时适市视狮。十时,适十狮适市。是时,适施氏适市。氏视是十狮,恃矢势,使是十狮逝世。氏拾是十狮尸,适石室。石室湿,氏使侍拭石室。石室拭,氏始试食是十狮。食时,始识是十狮,实十石狮尸。试释是事。




Transcrição Pinyin:


shi shi shi shi shi shi, shi shi, shi shi shi shi. shi shi shi shi shi shi shi shi. shi shi, shi shi shi shi shi. shi shi shi shi shi, shi shi shi, shi shi shi shi shi shi. shi shi shi shi shi shi, shi shi shi. shi shi shi, shi shi shi shi shi shi, shi shi shi, shi shi shi, shi shi shi shi shi shi. shi shi shi, shi shi shi shi shi shi shi. shi shi, shi shi shi shi shi. shi shi shi shi.

Tradução:

"A História do Sr. Shi que Comia Leões" 
Era uma vez, um poeta chamado sr. Shi. Ele apreciava muito comer leões e vivia numa casa de pedra. Ele estava querendo comer dez leões. Sr. Shi visitava o mercado de tempos em tempos. Um dia, às dez horas, dez leões apareceram no mercado. E aconteceu do sr. Shi chegar no mercado naquele mesmo momento. Sr. Shi viu que haviam dez leões, e os matou com flechas. Sr. Shi pegou os cadáveres e levou-os de volta para a casa de pedra. Mas a casa de pedra estava úmida, então o sr. Shi ordenou ao servo que secasse e limpasse a casa. Quando a casa ficou limpa, o sr. Shi começou a comer os dez leões mortos. Mas enquanto ele comia, ele descobriu que os cadáveres dos dez leões mortos que ele tinha trazido de volta eram, na verdade, cadáveres de leões feitos de pedra. Você pode explicar isso? 






Obs:


Se quiser ouvir, ouça um chinês lendo a história:


http://www.youtube.com/watch?v=Ckx8eHeWBn0

QUARTA-